domingo, 31 de outubro de 2010

Entre saltos e armas

Por Tatiane Galimberti


Capítulo Segundo


Enquanto estava presa no trânsito infernal de Nova York, fiquei repassando em minha mente cada parte da conversa que havia tido com David. Eu havia largado meu cargo de juíza em Seattle, minha família, amigos e toda uma vida estável. Eu estaria agora, arrependida?
Ainda não achava que o meu passado estava me afetando no trabalho. Eu sempre fui de expor a minha opinião e dizer o quanto um cliente meu estava sendo idiota.
Já havia feito terapia o suficiente e tomado remédios o suficiente. Eu estava bem agora. Pelo menos comparando à alguns anos atrás.
Cheguei em Nova York disposta a recomeçar minha vida do zero.
Comprei uma casa nova e um peixe que lhe dei o nome de Fred. Que só teve duas semanas de vida. E agradeci à ele profundamente a sua participação na minha vida durante essas duas semanas, enquanto o jogava na privada.
Gosto dos meus colegas do trabalho. São todos advogados muito competentes e apesar da competitividade excessiva que há entre eles, são pessoas legais.
Mas sou muito cuidadosa, e eles não sabem que eu penso sobre eles dessa forma. Vou lhe explicar. Sou uma pessoa objetiva, curta e grossa. Tomei todas as precauções para que eu não tivesse nenhum vínculo aqui. Com ninguém. Ninguém sabe nada sobre mim. Para eles sou apenas a experiente advogada, magistral demais para ser amiga deles. E não fiz nada para mudar essa imagem. Resumindo, não tenho relacionamentos aqui. Nunca tive. Não vou dizer que não sinto falta de um homem em minha cama, mas na confusão em que a minha vida se tornou é mais fácil substituir sexo por chocolate.
Depois de algumas horas de trânsito interminável, consegui chegar em casa. E essa era a parte mais estranha do meu dia.
Tomei um banho e comi um lanche enquanto checava minha caixa de e-mails. Odiava comer esse tipo de besteira, mas estava exausta demais para preparar alguma coisa saudável.
David havia acabado de passar o endereço de um novo cliente no qual eu deveria encontrar amanhã. Não havia grandes informações, somente seu nome e que se tratava de um divórcio litigioso.
Anotei o endereço em meu Blackberry, joguei a embalagem do lanche fora e fui para o banheiro escovar os dentes. Eu nunca havia reparado que fazia tempos que não tocava na minha caixinha de cremes, hidratantes entre outras coisas.
Eu costumava usar um creme diferente para cada parte do corpo. E eu ri disso.
Resolvi arruma-los em cima da bancada do banheiro. Poderia voltar a usá-los amanhã quem sabe. Deixei tudo ali e fui para cama.
Demorei pegar no sono. Comecei a pensar no George Clooney e não me pergunte o porquê.
E essa noite eu apenas sonhei. E foi muito longe de ser um pesadelo.
Eu sei o que você pode estar pensando. Que desta vez eu acordei do sonho com gritos de orgasmo.
Mas ainda bem que eu só grito quando tenho pesadelos.
Acordei bem humorada na manhã seguinte. Tomei um banho demorado e gelado e depois me arrumei. Não sabia quem era o meu cliente de hoje, mas eu sempre tive o bom hábito de me arrumar detalhadamente. Escolhi um vestido num tom de cinza escuro que sempre me realçava os olhos. Eu gostava. Abri o closet e nem demorei para agarrar meus sapatos louboutin que me olhavam com um ar de “me use por favor, por favor, faz tanto tempo”.
Tomei uma xícara de café, e deixei as coisas para que a empregada cuidasse quando chegasse.
Peguei minha bolsa e a pasta azul que sempre carrego comigo e chamei um táxi para que me levasse ao endereço de destino. Era mais fácil assim, odiava ir com meu próprio carro e ter que ficar procurando o local.
O motorista tentava a todo custo flertar comigo.
Isso porque eu não estava com uma aliança do tamanho de um boi, que as mulheres da minha idade costumam usar no dedo, em NY.
- “Seus cabelos escuros combinam perfeitamente com seus olhos azuis. É um contraste perfeito que raramente vemos por aí. Você tem uma beleza exótica”. – O motorista dizia sem tirar os olhos do retrovisor. E eu já estava pensando para qual hospital iriam me levar em poucos segundos quando o táxi fosse se colidir com algum outro carro, a não ser que ele esteja enxergando a estrada através da beleza dos meus olhos. Na verdade a cada palavra que ele dizia esperava que isso acontecesse o mais rápido possível. “Será que falta muito para você causar um acidente e calar a boca?” – Pensava comigo mesma.
Por fim chegamos ao restaurante. Perguntei ao gerente se George Lowell estaria me esperando. E ele me pediu que eu o acompanhasse.
Fui caminhando logo atrás do robusto gerente e quando cheguei à mesa do meu suposto cliente, o choque.
Eu simplesmente senti os meus pulmões pararem. Foi uma sensação tão intensa que se eu tivesse um Guru espiritual, ele diria que eu tive uma transcendência. Eu não podia acreditar em quem estava ali sentado naquela mesa, me esperando.
O gerente se retirou.
Eu ainda estava ali de pé. Em choque.
-“Richard? O que está fazendo aqui?”. – Falei sem ar nos pulmões. Teria um edema pulmonar bem ali. Várias formas de morrer em um único dia, estava impressionada.
-“Sente-se Louise”. – Ele falou calmamente.
E eu me sentei, afundando a cabeça entre os cotovelos prostrados em cima da mesa. Não conseguia nem olhar para ele. Minha sensação era semelhante à de uma criança quando os pais a encontram escondida debaixo da mesa.
-“Eu senti saudades de você. Você sumiu sem deixar rastro. Por que fez isso?”. – Ele falava num tom desesperado que me fez levantar os olhos e o encará-lo.
-”Eu não consegui lidar com a situação, Richard. Desculpe-me.” – Falei sinceramente.
-“Você dizia que não o amava mais. Que haviam se afastado e que pareciam ser dois desconhecidos. O que te fez mudar de ideia quando ele descobriu sobre a gente? Eu só preciso entender, preciso de respostas”.
Respirei fundo e dei uma olhada ao redor do restaurante.
-“Eu não tenho nada a dizer Richard, e agradeceria se não me procurasse mais e que não dissesse a ninguém onde estou”.
-“Mas que inferno, Louise. Nós éramos felizes!”- Ele agora aumentou um pouco o tom de voz.
-“Como conseguiu me encontrar aqui?”- Eu perguntei profundamente irritada.
-“Isso não importa. Só quero saber o motivo de estar fugindo de mim”.
Não havia um motivo, e eu sabia disso. Nos momentos finais do meu casamento de mais ou menos dez anos encontrei Richard.
Ele era jovial, me fazia rir. Tínhamos muito em comum. A época em que fomos realmente felizes durou exatamente 1 ano. Depois disso a minha culpa fez questão de estragar as coisas. E agora o que eu sentia por ele era apenas indiferença.
Eu estou sentindo que não tenho mesmo como fugir do meu passado.
-“Você quer que eu te leve para casa e te sirva uma xícara de chá e bolinhos?”. – Perguntei no meu maior tom de sarcasmo.
-“Você vai mesmo me desprezar assim, depois de tudo que vivemos e do tanto que eu viajei para chegar aqui?”. – Ele estava tão indignado quanto eu.
-“Eu não pedi para ser encontrada, volte para sua vida”.
-“Louise... eu não vou desistir de você assim. Seja lá quais foram os seus motivos, eu não os vou compreender se não me disser.”
E foi então que o motivo ficou claro feito um raio de sol em minha mente. “Louise você não pode estar com alguém que te procura até no inferno porque ainda te ama. Você é egoísta demais para estar do lado de alguém assim”.
E então resolvi deixar minha mente resolver as coisas com Richard.


quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Estar com você

Por Paloma Sabino

Ouça essa canção e lembre de mim.
Vista essa roupa e pense se eu vou gostar.
Antes de dizer não, tenha certeza de que eu não diria sim.
Quando sair, veja se vou estar lá.

Nos seus melhores sonhos quero ser seu sono.
Nos seus piores pesadelos quero ser seu despertar.
Nas suas preces quero ser seu anjo.
Nas suas descrenças quero ser sua força e esperança.

Dos seus olhos tão perfeitos sai a luz.
A minha luz.
A luz que me guia e que ofusca o brilho das estrelas.
Do teu sorriso, sai a verdade que me conduz.
Da sua boca sai calor, sai conforto.
Do seu corpo, sai de tudo que é bom, pelo menos um pouco.

Queria estar contigo sempre, para amar e mesmo assim viver.
Pois dizem que o amor mata,
mas você me cura, e te amar demais se me fizer morrer,
Vai valer a pena se for com você.


Relatos de um sobrevivente

Prólogo 

As prosas de um velho




Já parou para imaginar o mundo depois do mundo? Como serão as coisas quando nós, seres humanos, abandonarmos tudo isso? O que deixaremos para trás, o que os arqueólogos de outras civilizações encontrarão, quando pousarem suas naves espaciais neste lugar, num recanto qualquer do universo, do qual intitulamos Planeta Terra, essa imensa bola da qual vivemos?

O legado que os homens deixarão, será um legado de pedras. Escravos que com seu suor construíram as imensas pirâmides, romanos que ergueram fóruns, estátuas, e o próprio Coliseu, com a força de seus músculos, e pontes, arranha-céus, cidades verticais inteiras, criadas onde antes, só existiam árvores e animais.

Imagine todas essas imensas construções, deixadas à própria sorte, depois que nós, seres exóticos, tivermos partido?

Cidades inteiras abandonadas, as águias fazendo seus ninhos nas coberturas de prédios que antes custavam fortunas a qualquer ser humano. Lobos atravessam as ruas em busca de coelhos e ratazanas para se alimentar. Árvores e pequenas plantas começam a vencer, aos poucos, o asfalto. Trepadeiras começam a escalar as paredes. Um prédio ou outro cai, deixando montes de entulhos e alguns animais mortos, logo também devorados por outros animais. E carros, milhões e milhões de automóveis abandonados.

Outro grande legado do ser humano: Plástico, pneus, caixinhas de McDonald's, alumínio, copos descartáveis. Em parte esse lixo passará a fazer parte da terra, e com o tempo irá sumir, e se mesclar novamente a natureza. Depois de muito tempo quando que os seres humanos já não habitarem a terra como habitaram outrora, o lixo será paisagem natural de toda essa natureza. Uma lembrança constante aos descendentes, de o que a civilização à que eles pertenceram, que um dia dominou o mundo, deixou apenas aquilo para trás.

Lixo.

Você consegue imaginar essa cena? Consegue absolver a imagem, de grandes pontes cobertas por plantas e afundadas nos mares? cidades esquecidas pairando desertas, sem os sons do trânsito, dos gritos, buzinas, risos e choros constantes, e apenas um eco de silêncio lembrando aos que sobreviveram, a glória de um passado que já não existe mais?

Consegue imaginar este mundo?

Pois bem, é neste mundo que eu vivo.



Nestes rascunhos que escrevo, nessas noites frias e chuvosas de verão, me lembro dos meus anos de jovem. Cresci ouvindo histórias de grandes heróis e vilões do passado. De quando o ser humano se julgou acima da natureza, e essa o consumiu sem pena nem piedade. Do mundo antes das catástrofes começarem, e o lugar onde eu vivo, que já foi chamado de terra dos guaranis, novo mundo, e nos últimos suspiros da humanidade, politicamente denominado "Brasil", ainda ser um lugar para samba, futebol e belas mulheres..

Lembro de certa vez ter encontrado restos de uma revista. Era de um nome engraçado, "Play Boy", Algum dialeto que se perdeu no tempo talvez. Era uma uma revista que mostravam mulheres nuas, e se dizia que aquelas mulheres ganhavam fortunas para estar ali. Folheei os restos das páginas rasgadas, mas inteiro ainda estava o nectar daquela preciosidade. As fotos de uma bela mulata de cabelos cacheados, corpo magro e bonito, deliciosamente contornados e definidos, algo inimaginável. Uma mulher digna de sonhos. Não havia imperfeições, não havia defeitos, era uma delícia digna de ser fodida. Eu cheguei a duvidar que algum dia, mulheres daquele jeito houvessem existido. Parece que no passado as pessoas podiam ser realmente perfeitas, ou quase isso.



Lendas e superstições são cantadas sobre como foram aqueles tempos em que nós, humanos, éramos os senhores da Terra. Pouco se sabe sobre como viviam nossos antepassados. 

Muitas línguas se perderam, muitos livros foram impiedosamente consumidos pelo tempo, mas a quantidade de restos que encontramos, não deixam dúvidas de que eles criaram e consumiram coisas suficientes para a humanidade inteira, em pouco mais de 300 anos. 

Chega a ser divertido olhar para os restos de uma loja  "McDonald's", nesta cidade deserta, e imaginar que pessoas entravam ali e encontravam comida pronta e preparada, eram servidos em 3 minutos, comiam em 5, e saiam satisfeitos logo em seguida. Realmente estranho.

Minhas lembranças, as lembranças de um velho cansado, podem se misturar e serem contadas aleatoriamente caso eu não me coloque na linha enquanto desenho as palavras deste livro de memórias. Peço que me entendam caso alguma parte do passado se perca, ou se eu aumentar um ou dois fatos. Acontece quando você, assim como eu, consegue sobreviver à selva dos dias de hoje, e viver pouco mais de cinquenta verões. Dizem que noutros tempos, os homens podiam viver até cem anos! Não consigo me imaginar vivendo duas vezes tudo que já vivi. Realmente, o mundo mudou.

Não sei também por onde começar este livro de relatos, pois bem, vou começar do dia em que vi o desconhecido pela primeira vez. Foi na flor da minha juventude, quando eu já havia sido promovido sargento nas forças de defesa de nossa antiga comunidade, e encontramos o forasteiro vagando pelas ruas do nosso lado dos restos da cidade.

Não vou contar tudo desde já, para não tirar a graça dos suspenses e aventuras que ainda haverão nesta narrativa, tudo a seu devido momento. Ah! Foram anos duros aqueles, anos acinzentados, mas também, anos felizes. Os anos em que a Raça Humana finalmente reaprendeu a sorrir.

E que sorrisos, e que aventuras.

Pois bem, que a história comece.

Continuação...


O Segredo

Por Antonio Fernandes

Um dia agente vê que os nossos passos não nos levaram para o lugar que havíamos planejado.
Um dia agente percebe que alguns amigos que gostariamos de ter ao nosso lado, já não estão mais lá. Agente olha pra trás e vê que alguns amores, que juramos ser eternos, morreram, e tudo que resta deles são lembranças.
Um dia agente descobre que a criança que havia dentro de nós está morrendo pouco a pouco, e os culpados disso, somos nós mesmos.
Um dia agente para e descobre que, pouco a pouco, vamos parando de dizer "bom dia", "obrigado" e "até logo", nossos "eu te amo's" vão se tornando cada vez mais corriqueiros, e nossa vida vai entrando num ciclo de tédio de rotina.
Um dia agente descobre que já passaram dias demais, e que algumas atitudes que sabemos que já deviamos ter tomado, ainda não tomamos.

Então nós olhamos esperançosos e presunçosos para o futuro, e depositamos nossa confiança nele.

Mas descobrimos que o futuro, é incerto.
Descobrimos que você planeja cuidadosamente cada passo, mas o futuro se encarrega de bagunçar todos os seus mapas, mudar todo o caminho, e também se encarrega de trazer tempestades e furacões, mares e terremotos para aqueles "passos cuidadosos" que você planejou.

O passado te atormenta, e o futuro te enlouquece. Se tentar ver por onde andou, lamentará as escolhas tomadas, e se tentar ver por onde andará, perderar-se-á  nas trilhas do desconhecido.

Que fazer?

Já diziam os romanos "Carpe Diem", enquanto tomavam uma boa taça de vinho espanhol nas planícies de Toscana. Viva o hoje. Viva o agora. Desfrute os momentos de sua vida da forma mais intensa que conseguir manifesta-los. Não como se fossem os últimos, pois viver pensando que um dia irá morrer é pedir depressão profunda. Viva o agora como se fosse pra sempre, e cada momento do resto da eternidade fossem se resumir a extase daquele ínfimo momento. aquele ínfimo prazer.

Aprenda a aproveitar as situações, e a tornar mais feliz o mundo para você, e aqueles a sua volta. Dê bom dia a moça da banca de jornais, diga obrigado quando te deixarem passar, e retribua com um sorriso. Ofereça a alguma pessoa qualquer algumas palavras alegres e divertidas.

Conte uma boa história a uma criança, mas lembre-se de escutar uma grande aventura de um senhor de idade. Trate as pessoas melhor do que gostaria de ser tratado, e não espere nada em troca. E nem precisará. Basta se lembrar da lei da física, "tudo que vai, volta." Se tratar as pessoas bem, você será naturalmente bem tratado.

Aprenda a sentir os gostos, não vou dizer que deve comer deste ou daquele jeito, rápido ou devagar, mas seja da forma que quiser, aprecie aquele momento. Sinta os cheiros, sabores, e coma também com os olhos. Desfrute de uma bela taça de Sunday de chocolate antes de devora-la.

Use bem seus momentos, eles não voltarão.

E aproveite-os, para quando for pensar no passado, não pensar triste em como poderia ter sido, mas se lembrar alegre de como realmente foi.

E saiba que, depois que aprender a viver e aprender com os momentos, o futuro não será mais algo para se ter medo. Será sim algo a se esperar ansiosamente. Novas descobertas, novas aprendizagens, novos amores... O futuro reserva grandes colheitas para aqueles que semeiam felicidade. Distribua sorrisos, e faça o seu.

O segredo da vida, está no tempo.

Carpe Diem



terça-feira, 26 de outubro de 2010

Entre Saltos e Armas

Por Tatiane Galimberti


Capítulo Primeiro

Era só mais uma daquelas noites em que me via acordar gritando, banhada em suor. Eu já deveria estar acostumada com esse tipo de pesadelo afinal, mas eram sempre assim: cruéis e assustadores.
Fiz o que sempre fazia após os ataques de pesadelo: caminhei até a cozinha e bebi um copo com água e açúcar. O que não adiantava em nada, pois eu sempre demorava uns longos vinte minutos até me recompor novamente. Mas simbolicamente, água e açúcar estariam me acalmando.
Eu estava naquele apartamento novo, faria exatos oito meses, e sempre que eu acordava me perguntava “que lugar é esse?” e depois de percorrer meus olhos pelas paredes do novo quarto, me lembrava onde estava, e que o pesadelo na verdade, tinha sido real.
Fui até a sala, e sentei-me ainda com o copo com água entre as mãos. O relógio marcava 3 horas da manhã. Irônico. Em algumas seitas satânicas, 3 horas da manhã é considerada à hora do demônio. Esse bem podia ser um sinal! Talvez eu precisasse me converter. Eu ri de mim mesma sobre esse pensamento.
E agora o que eu faria? Ficaria ali sentada, olhando para o teto?
Desde que eu comecei a minha terapia, uma das ordens da minha terapeuta era que eu não deveria morar sozinha. E aqui estou, sozinha. Eu não quero a companhia de ninguém, estou bem assim. Pelo menos eu achava isso.
Adormeci ali mesmo no sofá. E quando acordei pela manhã com reflexos do sol que adentravam pela sala, notei que havia uma mensagem não lida no meu celular, que vibrava insistentemente.
Eu não fazia questão de manter contato com ninguém também. As pessoas haviam se tornado chatas e entediantes para mim.
- “Louise, pelo amor de Deus! Você não pode se esconder para sempre, minha filha. Eu sei que isso tudo foi muito difícil para você, mas tudo seria bem mais fácil se nos deixasse te ajudar. Nós te amamos. Por favor, me ligue de volta. Mamãe.”
Esse tipo de mensagem era frequente na minha caixa de mensagens. No começo eu até me comovia, mas depois de um tempo aprendi a ignorar. Era melhor assim. Já tinha dito à todos os meus parentes, amigos e até aos animais de estimação que eu não queria manter contato por algum tempo. Era como se eu tivesse tirado férias de todos.
Tomei um café rápido e fui me arrumar para o trabalho.
Sou advogada. Me formei aos 24 anos no curso de Direito. Aos 25 anos fui uma das juízas mais jovens a exercerem o cargo, e atualmente aos 43, posso dizer que trabalho somente por hobby. Não que as pessoas saibam disso. Faz parte do meu tratamento terapêutico ocupar a mente com alguma coisa. E trabalhar me pareceu uma ótima opção. Tentei fazer várias coisas como: cozinhar, entrar para o clube do livro, curso de pintura... mas não fui à frente com nenhum deles.
No trabalho, estava cuidado dos processos civis. Era uma coisa mais “light” para mim, dado tudo com que já trabalhei.
Minha cliente já estava me esperando quando cheguei.
- “Bom dia Sra. Weston”. – Falei educadamente.
- “Bom dia? Meu marido agora quer ficar com o cachorro! Isso não parece um bom dia para mim!”- A mulher cuspiu furiosa.
-“A senhora não ligou para o fato do seu marido exigir a guarda dos filhos, mas está furiosa pelo cachorro?”. – Me sentei calmamente na cadeira de frente para a mulher loira e siliconada, colocando minha bolsa sobre a mesa e a fitando perplexa.
-“Ted está na minha vida bem antes dos meus filhos”. – A loira enrola uma dos cachos loiros entre os dedos.
-“Você só pode estar brincando comigo!”- Confesso que sempre fui bem ética no que faço, mas isso já era demais.
-“Você está me julgando?” – A loira agora havia se levantado e estava gritando comigo.
-“Sim estou. Quem é que troca os filhos por um cachorro?”. – Perguntei sem mover meus olhos dos dela.
Eu realmente não tinha o menor jeito de lidar com gente desse tipo. E não é o certo, porque nós advogados devemos lidar com cada caso em particular com a maior imparcialidade possível. Tentei me segurar, mas não deu, fazer o que.
Eu já ia começar a falar umas boas coisas para a dondoca à minha frente, quando fui interrompida pelo chefe do escritório.
- “Louise, o que está havendo?”. – Ele abriu a porta, e fitou primeiramente à mim e depois a mulher em pé.
-“Isso é uma falta de respeito com os clientes”. – A mulher agarrou sua bolsa cheia de fru frus e saiu correndo da sala.
“Me desculpe, David”. – Comecei sinceramente. E estava mesmo sendo sincera, pois não queria atrapalhar o negócio de ninguém ali. “Ela se importa mais com o cachorro do que com os filhos”. – Olhei para ele com um ar desesperador.
-“Eu já esperava que isso fosse acontecer algum tempo, Lou”. – Ele abaixou a cabeça. “Quando eu concordei em te deixar trabalhar aqui, sabia que logo você deixaria seus sentimentos atrapalharem seu trabalho”.
Eu olhei para ele incrédula. Não acreditava no que estava ouvindo. Eu sempre fui boa no trabalho. Se a minha vida pessoal era um lixo, não podia dizer o mesmo da minha vida profissional. Ele era o único do escritório que sabia dos meus problemas. E isso era tão injusto.
-“Isso não tem nada haver com...”. – Eu já ia protestar, quando ele me completou da maneira mais fria possível.
-“Com você ter visto seus dois filhos serem mortos na sua frente? Tem certeza que não?”.
Silêncio.

sábado, 23 de outubro de 2010

Boas Vindas

É com felicidades que levantamos nossas canecas transbordas em cerveja para comemorar a inauguração dessa nossa grandiosa e requintada taberna.

Nosso Menú, dos mais variados, contará com belas histórias, para serem apreciadas junto a uma boa taça de Martini. Fortes textos sexuais, que não caem melhor que com uma dose dupla de Whisky Escocês, além de várias filosofias e pensamentos aleatórios sobre o mundo, podendo estas ser bebidas junto a uma boa dose de vodka acompanhada de um forte charuto cubano, e claro, muito mais.

Nossa equipe, composta dos mais refinados e requintados Gentlemans e mademoiselles, servirá nossa casa de belos textos e prosopopéias. Escolhidos a dedo para proporcionar o melhor entretenimento escrito, esses senhores e senhoras prometem proporcionar a vocês belas horas de prazer e leitura.

É com felicidades que inauguro essa Taberna. Nossa meta: Apresentar uma literatura rápida e divertida, textos inteligentes e envolventes, falando sobre filosofia, o mundo, sexo, política, humor e uma pitada de boas tragédias.

Esperemos que aqui você possa rir, chorar, aprender e se emocionar. Que aqui possa ser um retiro, para todos aqueles que querem fugir por uns segundos de seus próprios problemas, e talvez descobrir algumas respostas para sua vida.

Eu, Antonio Fernandes, idealizador deste projeto, agradeço a todos vocês à presença, e tenham uma ótima estadia.

Uma boa caneca de cerveja servida à zero graus a todos.

Divirtam-se.